quinta-feira, setembro 16, 2004

A Nação do Estado



A Nação do Estado


Numa época em que a confiança e a moral portuguesa estão em baixo, num país afundado numa crise, que chega aliás á grande maioria, na simples diminuição do poder de compra e da constatação que cada vez sobra mais mês para além do ordenado, o Euro 2004 foi uma injecção de confiança, o grito de uma nação sebastianista habituada tradicionalmente ás glórias de outros tempos.
O sentimento nacionalista está de volta, a lealdade é crescente e os símbolos nacionais idolatrados.
A consciência de um passado e futuro comuns, a comunidade dos sonhos, o sentimento de pertença a um todo (que é bem mais do que a soma das partes) levaram às maiores manifestações de união, os franceses foram por exemplo escorraçados pelo zé povinho, que entendeu a liberté, egalité et fraternité como uma ocupação militar às mãos de uma invasão estrangeira.
O futebol assume hoje igual capacidade, pela emotividade da competição, pelas massas que move, pela cobertura televisiva que recebe, enfim, por tudo aquilo que o eleva a um estatuto quase religioso, que conhece aliás uma periodicidade quase similar, ou seja, os Domingos e que recebe também fortes manifestações de fé e variados sacrifícios.
O futebol é capaz de unir a nação por uma causa comum, é o despertar do nacionalismo em detrimento todavia da estatalidade, porque antes do Estado já havia a Nação, o que une cada português não é mais a lealdade política mas sim o fenómeno nacionalista despoltado pelos fenómenos desportivos e pela sua mediatização. O Estado soberano está em crise, e o afastamento da população em relação à participação política é facilmente verificável, as intrigas, a corrupção, as ofensas, o afastamento das instituições em relação à população, as reais competências e funções dos políticos e dos seus órgãos são desconhecidas da maioria da população, que também não procura saber e que também ninguém quer ensinar, porque eleitores analfabetos ou desenformados são mais facilmente manipulados.
A prova que afinal é possível unir a população, que os portugueses precisam de acreditar, que o espírito nacional está presente e que poderia ser canalizado para o interesse nacional está patente no futebol. É preciso interpretar este fenómeno, é preciso entender o grito desesperado de quem não tem mais nada onde se agarrar.
Quantas mais bandeiras serão precisas para que a classe política desça da sua cadeira e responda a este apelo?


Nelson Ventura
Posted by Hello