domingo, outubro 31, 2004

A Identidade Europeia



A Identidade Europeia.



O conceito de identidade europeia é, cada vez menos problemático, de uma forma mais ou menos acentuada os nacionais da U.E sentem-se europeus, ainda que as suas nacionalidades sejam aquelas com que realmente se identificam, a consciência de uma nacionalidade europeia está de certo modo presente em quase todos. Mas qual é afinal a origem dessa união? O que leva tantos Estados a restringirem parte da sua soberania em prole de um projecto conjunto?
Os povos europeus partilharam os grandes acontecimentos históricos da Humanidade, partilharam experiências comuns -Feudalismo, Renascimento, Iluminismo, Revolução Francesa, Revolução Industrial e viveram também duas grandes guerras que por duas vezes mostraram as consequências da desunião e insensatez dos povos, estas experiências enriqueceram e situaram a Europa no mundo e fundaram a sua especificidade.
Em Maastricht , os signatários do Tratado da União Europeia, instituíram a cidadania europeia, essa mesma cidadania que traduz os valores fundamentais partilhados pelos europeus, essa herança cultural comum, que apesar das divisões políticas, religiosas e até geográficas valoriza e aprofunda a cultura europeia.
Os povos europeus são diferentes, e o alargamento recente da U.E assim o prova, os padrões de comportamento, a língua as próprias características físicas deixam perspectivar essa diferença a olho nu. A consciencialização para a cidadania europeia, deve todavia respeitar essas mesmas diferenças, fortalecendo-se com elas, potencializando os seus interesses comuns e combatendo/absorvendo as suas discordância. A cidadania europeia não deve nem pode sobrepor-se às nacionalidades individuais, sob o risco de minar a sua própria raiz, isto porque a cidadania europeia completa e não substitui a cidadania nacional.
A U.E tem tentado conduzir a sua política apostando sempre em evidenciar os traços comuns dos patrimónios europeus, em reforçar o sentimento de pertença, respeitando sempre as diversidades culturais. Todavia este parece-me ser um processo longo e complicado, a identidade e a pertença, pressupõem uma consciência dessa mesma identificação. As políticas comunitárias têm tentado igualar o nível de vida das populações europeias através de dinâmicas sociais e económicas, de comunicação e de mobilidade, essa é a melhor forma de consolidação de uma identidade europeia e são essas que os cidadãos dos países membros mais têm experimentado.
A U.E procura por um lado desenvolver e ampliar um espaço cultural comum, e por outro lado confere à especificidade das culturas que a compõem uma importância acentuada.
Apesar de todo este esforço, o desconhecimento cultural em relação a muitos países da U.E, especialmente em relação aos recém entrados, parece-me evidente, a distância geográfica é um entrave importante e a divulgação que os mass media fazem dessas mesmas culturas é insuficiente.
Todavia a Europa que se pretende edificar é sobretudo, uma Europa plural, e quando falo em plural, refiro-me também a uma Europa que leva os valores da diversidade e do diálogo para além das suas fronteiras. Esta preocupação é evidente pelos acordos estabelecidos com países terceiros no âmbito do apoio às actividades culturais locais e aos intercâmbios.
No caso de «a cultura não ser a chave da vida e da identidade da UE, o progresso de integração europeia não chegará à maturidade», afirmou Josef Jarab, na Fundação Calouste Gulbenkian, no âmbito da conferência Novas Fronteiras da Europa, e são esses mesmos aspectos culturais de integração que sedimentaram a união “plena”.
Apesar de ser uma manta de retalhos e de muitos analistas problematizarem a sua expansão, nomeadamente pela afirmação de que o alargamento ao PECO trará divisões entre membros de 1ª e 2ª classe e por outro lado esse mesmo alargamento não poder ser evitado, visto que uma Europa amputada não é uma verdadeira Europa; por muito que afirmem que a expansão europeia será essencialmente horizontal e assente numa moral de conveniência e não de convicção, e que a nível militar a sua autonomia não se afirma pela falta de patriotismo dos contingentes militares em defenderem a Europa, bem como os próprios estados em pagarem a defesa do espaço europeu. A verdade é que as políticas com vista a uma integração cada vez mais ampla continuam, provando que apesar de muitos avanços e alguns recuos, o todo é mais que a soma das partes.



Nelson Ventura
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sexta-feira, outubro 15, 2004

Personalidade do Mês de Outubro



O General Sem Medo



Humberto Delgado nasceu no dia 15 de Maio de 1906, em S. Simão da Brogueira, Torres Novas, e foi, no seu tempo, o mais novo e um dos mais brilhantes generais das Forças Armadas Portuguesas. No seu percurso militar teve uma magnífica carreira, cheia de incidentes e coberta de muita glória. Conviveu, quer com a chefia de Sidónio Pais, quer com a ditadura salazarista que, mais tarde, o demitira das
Forças Armadas.
Foi um extraordinário militar, astuto e exímio político e escritor. Frequentou o Colégio Militar, cujo curso concluiu em 1922, ingressando na Escola Militar, onde tirou os cursos de Artilharia de Campanha, em 1925;
de Piloto-Aviador, em 1928 e de Estado-Maior, em 1936. Foi promovido ao posto de brigadeiro em 1946 e ao de general em 1947.
Foi um escritor de génio, dentro da sua convicção e no gosto que
tinha na verdade e no perfeito cumprimento dos deveres como cidadão e como político. De entre os seus escritos, destacam-se os livros tão polémicos "Da pulhice do Homo Sapiens" e o "Manual da Legião Portuguesa". Embora tivesse servido a Ditadura em alguns cargos, vindo da América, onde desempenhou o lugar de adido militar, opôs-se corajosamente à Ditadura e a Salazar, já que pela vivência e pelas fortes convicções se converteu à Democracia política e, nas eleições presidenciais de 1958, sendo general da aeronáutica candidatou-se, pela oposição, tendo contestado os resultados eleitorais que, fraudulentamente, deram a vitória ao almirante Américo Thomaz.
Demitido das Forças Armadas encabeçou, no estrangeiro, o movimento de oposição ao governo português. Trabalhou muito no estrangeiro, no campo político e na tentativa de modificar as coisas no seu País. O exílio, porém, é do mais dramático que se pode viver e foi uma vítima de privações, de intolerâncias, de perseguições e, finalmente, de uma armadilha sabiamente montada pela PIDE, que o conduziu à fronteira portuguesa, perto de Badajoz, em Villanueva del Fresno, onde, em 1965, foi assassinado, por ordem da Ditadura, assim como a sua fiel secretária, a brasileira Arajaryr Moreira Campos.

OBVIAMENTE, DEMITO-O...

O Café Chave de Ouro está repleto. Estamos a 10 de Maio de 1958, a um mês das eleições para a Presidência da Republica. Primeiro acto público com a presença do Candidato Humberto Delgado depois de iniciado oficialmente o período eleitoral.
Surge a primeira pergunta, do correspondente da France Press.
"Qual a sua atitude para com o Sr. Presidente do Conselho se for eleito?"
E a resposta, imediata, enérgica, sem uma hesitação, sem um tremor:
"Obviamente, demito-o".
É difícil acreditar no que estamos a ouvir. Mais que uma frase, é uma bomba. Uma revolução. Por terra a muralha que se opõe ao sacrilégio de dizer em público palavras agressivas ou menos respeitosas para com o "Chefe Supremo".
Rebentar da bomba que verdadeiramente inicia o caminho que o introduz na História, e lhe carreia o cognome de "General sem Medo".
"Sem medo" contagiante que liberta de muitos medos. E cria outros que o tempo mostrará.


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A Promiscuidade Institucional


A promiscuidade institucional

Quer parecer que este país está destinado a uma implementação plena do sentido democrático, é de facto notório a vontade de o fazer, mas para isso não basta apenas dar forma às concepções teóricas e ideológicas.
Um dos pilares básicos da democracia é a separação dos poderes, a par de uma interdependência interna, que serve como uma forma de evitar os abusos de poder que possam corromper o normal desenvolvimento das actividades das instituições.
Aos militares é dada uma importância vital na segurança e na manutenção da ordem pública, mas tal é feito em concordância com a cúpula do órgão decisório, sendo este o Presidente da República.
Ao longo dos anos ficou provado historicamente e em vários países, que a excessiva preponderância militar na vida política pode ter consequências negativas.
Na Guiné-Bissau tem sido evidente que o principal destabilizador da ordem pública são de facto os militares, não na prossecução dos interesses nacionais ou mesmo da população, mas sim dos seus próprios interesses. Defendem apenas os seus interesses pessoais, sendo que no caso de se encontrarem descontentes, podemos estar face a uma eventual crise nacional.
Ilustrando esta ideia vemos sectores da actividade económica, essenciais ao desenvolvimento dos países, encetando meios legítimos de contestação, tais como manifestações públicas de descontentamento, de forma a pressionar os sindicatos e conseguirem negociar formas mais favoráveis ao desempenho das suas actividades. Estes sectores veêm a sua luta dificultada por obstáculos de cariz militar na sua velha máxima de "segurança e na manutenção da ordem pública", seja qual for a dita ordem. Talvez não fosse má ideia definir outros estatutos para os militares, ou seja, até mesmo sindicalizá-los. Não serão eles apenas um sector da vida pública?
Na Guiné-Bissau ficou mais uma vez provado que estando os militares descontentes estamos de novo com uma crise em mãos. A relação entre os militares e o governo é promíscua, sendo necessário ambos os sectores criarem condições para agirem de uma forma mais autónoma, que poderia passar , e porque não, pela concepção de uma nova fórmula estatutária.


Jair Semedo
NEA
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